Editorial
Acidentes de percurso
Segundo o professor A. Delfim Netto, ex-ministro da Economia, a história do mundo tem se mostrado muito mais obra de acidentes de percurso. Episódios como a Queda de Constantinopla (1453) foi decisiva no descobrimento do Brasil, enquanto a Revolução Francesa (1789) impactou no povoamento e no desenho cultural e geopolítico que perdura aqui até hoje.
A Primeira Guerra Mundial (1914-1918), por sua vez, teve muito peso no avanço do nosso setor industrial, numa economia ainda muito dependente da cafeicultura, embora com relevante produção no setor têxtil. Nessa ocasião a Europa reduziu suas exportações devido ao conflito bélico, o que abriu espaço no Brasil para empresários implantarem produção doméstica de manufaturados. Segundo o site da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em 1920 já havia 4.458 fabricantes registrados.
A quebra da Bolsa de Valores (1929) foi um acidente duro para o setor do café, mas que reforçou ainda mais a busca em ampliar o setor manufatureiro, em um Brasil posicionado como 48ª economia global, bem modesta diante da atual 8ª posição.
Sob outro acidente, durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) o então presidente Getúlio Vargas emprestou a cidade de Natal, RN, ao exército dos EUA, em troca da construção de nossa primeira siderúrgica nacional, já que ficava inviável ser uma nação industrializada sem produzir metais.
Desde então, o Brasil teve as maiores taxas de crescimento do mundo e era grande exportador até os anos 1980, quando se tornou uma nação emergente com altos custos para produzir e exportar.
Neste acidente atual, chamado Covid-19, pode estar um recomeço, com reformas estruturais que devolveriam um pouco da competitividade perdida. E não se trata de um sonho se observarmos a matéria da seção Especial, onde dados do Governo Federal mostram que em 2019 o país exportou US$ 193 milhões em parafusos e afins, contra US$ 621 milhões em fixadores importados.
Sérgio Milatias