Entrevista
Aldo Hector Lo Russo
Sócio e gerente de fábrica de fixadores aponta um futuro promissor do setor industrial na Argentina
Ao encontrar um cidadão da Argen-tri-na (sic) fica difícil não tocar no tema futebol, ainda mais agora. Além de tricampeã mundial, nossos vizinhos são o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, enquanto para eles somos o primeiro. (Foto - Aldo Hector lo Russo)
De janeiro a dezembro de 2022 vendemos aos “hermanos” US$ 57,2 milhões* entre parafusos e afins, mesmo com pouca tradição nesse tipo de exportado. De tudo que vendemos em fixadores ao exterior 31% foram para eles. Em seguida vem os EUA, 20%; Paraguay, 11%; Alemanha, 4,7%; França, 4,4%.
Obviamente, o tema desta entrevista envolve, uma pitadinha de bola, além da fixação e a indústria argentina como um todo que, segundo nosso colega, começa a se redesenhar um cenário promissor para a produção interna nos próximos cinco anos, apesar das durezas momentâneas.
Revista do Parafuso: Primeiramente, parabéns pela merecida conquista da Copa do Mundo! “O futebol é a coisa mais importante dentre as menos importantes" (Arrigo Sacchi, ex-treinador italiano). Portanto, podemos esperar impactos positivos daqui por diante no cenário socioeconômico argentino com essa conquista?
Aldo: A conquista da Copa representou uma grande alegria para o povo argentino, mas não creio que tenha impacto econômico. Devido ao volume de sua dívida externa, a Argentina se encontra em um processo muito difícil para a economia industrial, já que a falta de dólares tem impacto direto nas atividades. O nível de inflação decorrente da concentração da economia argentina continua elevado, com taxas de juros acima de 100%, o que também impacta na atividade industrial, principalmente na dinâmica dos investimentos. A ação do Governo nesse problema consiste em administrar o comércio – que melhorou substancialmente desde a posse de Sergio Massa (Ministro da Economia) –, controlar a inflação por meio de acordos de preços e subsidiar fortemente as taxas de juros para as pequenas médias empresas do setor industrial, as PYME. Estimativas para 2023 indicam possibilidades de crescimento da atividade econômica, mantendo os bons níveis de 2022, apesar de ser aqui um ano eleitoral.
Como industrial não posso deixar de salientar que em nosso país são sempre as PYME que dinamizam os empregos e, apesar de todas as dificuldades, continuamos a crescer, a atingir objetivos internos e abrir novos mercados externos.
Aqui existem cerca de **20 empresas formais que produzem parafusos, porcas e outros. A quantidade anual varia entre cinco e oito mil toneladas.
O Brasil possui cerca de mais de 350 fabricantes de fixadores. Quantas são na Argentina e qual é o volume anual estimado em toneladas?
Aqui existem cerca de **20 empresas formais que produzem parafusos, porcas e outros. A quantidade anual varia entre cinco e oito mil toneladas. Isso indica que mais de 80% do consumo de fixadores aqui é importado. Portanto, ainda temos um longo caminho a percorrer para expandir a produção nacional.
Quais as linhas de fixadores mais predominantes feitas em suas fábricas?
Entre as mais importantes estão fixadores leves, Parker, Philips e parafusos autoperfurantes.
Com cerca de 46 milhões de habitantes, a produção automotiva argentina em 2021 foi de 434.753 veículos, o que dá um carro para cada 106 pessoas (95 no Brasil). Qual a participação das fábricas locais de fixadores como fornecedoras neste segmento?
A participação local neste segmento ainda é muito pequena porque as montadoras decidem as compras de forma centralizada e muitas manufaturas que trabalham para elas estão no Sudeste Asiático ou no Brasil. Estima-se que apenas 5% é fornecido pela indústria nacional, mas não há dados específicos.
A importação de fixadores no Brasil foi de US$ 1,079 bilhão em 2022. Como isso se encontra no seu mercado?
Não tenho dados muito precisos sobre essas linhas de importação em relação aos valores já que a Câmara que nos representa não elabora nenhum tipo de relatório e é muito difícil desagregar essa informação das estatísticas dos órgãos oficiais.
Como está se saindo o Governo Federal no que se refere a indústria? O que podemos esperar de melhoras para os próximos cinco ou dez anos?
Para que você tenha uma ideia da mudança substancial que ocorreu na política industrial antes do governo do ano de 2019 e do primeiro ano do atual governo em 2020, posso dizer que o orçamento da Secretaria PYME para 2019 foi de 3,4 bilhões de pesos argentinos (cerca de US$ 23 milhões), e em 2020 foi de 127 bilhões de pesos (US$ 850 milhões). Além disso, no ano passado o governo destinou 250 milhões de pesos (US$ 1,7 milhão) para subsidiar as tarifas industriais. Ou seja o go-verno federal aposta muito forte neste setor. Portanto, dadas as oportunidades que surgem devido à reconfiguração do comércio econômico internacional imposta pela guerra na Ucrânia e o confronto econômico entre Estados Unidos e China, acredito que os próximos cinco anos serão fortemente apoiados pelo governo no sentido de elevar a exportação e fortalecer o mercado interno. Quero destacar o impacto da construção do gasoduto Néstor Kirchner, que trará forte crescimento para a indústria de petróleo e gás e derivados, afastando a decisão política do governo federal de que a proporção de componentes industriais nacionais deve ultrapassar 50% na construção do mesmo.
As questões relacionadas a moeda entre o câmbio oficial e o paralelo, além de restrições para compras externas, incluindo máquinas, na qual o Brasil também é dependente desse tipo de importação.
Ficou demonstrado na Argentina que a taxa de câmbio utilizada no aparato industrial é a oficial. Câmbio paralelo ou ilegal impacta nos custos das grandes empresas, devido ao processo de fuga de capitais, elas adquirem moeda estrangeira no câmbio paralelo, após nacionalizarem suas controladoras, esse percentual é que influencia nos custos dos insumos. A obtenção de licenças para a compra de máquinas que permitam o acesso à moeda oficial só é restrita se a empresa solicitante não tiver como justificar economicamente onde obterá os pesos para adquirir a moeda estrangeira.
A política de investimentos que definimos para os próximos quatro anos passará pela ampliação do parque fabril, aquisição de novos equipamentos e construção de um laboratório próprio para testes de nossas peças.
Além da presidência na Taller Baigorria, você é atuante em entidades do campo industrial. Fale sobre ambas e o que esperar para os próximos anos.
Sempre tive uma participação ativa no sindicato empresarial em meu país. Hoje sou autoridade da Associação de Fabricantes de Autopeças e Componentes (AFAC) e Subsecretário da Confederação Geral de Empresas da República Argentina. Em ambos, tenho participado ativamente nas discussões e elaborações de propostas destinadas ao governo, ou reivindicações de parceiros e influenciar futuras políticas industriais.

Rita Cosentino Hoy e Aldo Hector Lo Russo
Hoje a presidência da Taller Baigorria está a cargo de Rita Cosentino, atuando como sócia da empresa, cuidando dos processos industriais, desenvolvimentos da modalidade produtos de inovação tecnológica. A política de investimentos que definimos para os próximos quatro anos passará pela ampliação do parque fabril, aquisição de novos equipamentos e construção de um laboratório próprio para testes de nossas peças. Em relação ao comércio interno, estamos trabalhando fortemente para inovar no comércio digital, loja virtual e desenvolvimento de novos produtos para a indústria de reposição do mercado automotivo, como itens para motocicletas, indústrias moveleiras, ferragens e qualquer ramo industrial que solicite produtos além dos tipos de fixadores que fazemos em nossas prensas. Por outro lado, continuamos avançando no comércio exterior onde exportamos regularmente para mais de 15 países, estando hoje entre nossos principais mercados os EUA, Polônia, Equador e Chile. Estamos estabelecendo uma aliança estratégica na Espanha para comercializar parafusos e porcas de roda em todo o continente europeu.
**Consultamos o site da associação local das empresas de fixadores (https://cafabyt.com.ar/), no qual o número de associadas passa de vinte, mas algumas estão extintas, como relatou Aldo, inclusive com o site fora do ar. Segundo ele, existem exemplos de indústrias que tem uma só máquina, sendo apenas uma revenda.
Aldo Hector Lo Russo
Subsecretário da Confederação Geral de Empresas da República Argentina, autoridade da Associação de Fabricantes de Autopeças e Componentes (AFAC), foi vice-presidente do Instituto Nacional de Tecnologia Industrial (INTI), além de ser sócio e gerente da fabricante de fixadores Taller Baigorria.
ldolorusso@baigorriaindustrial.com