Avaliação mecânica de três tipos de parafusos de fixação de abutments sobreimplantes: "estudo in vitro"
Parte final
Discussão:
O maior ângulo de rotação ocorre no primeiro aperto do parafuso onde temos o maior pico de rugosidade entre as superfícies de contato do abutment/ implante, do que nas montagens subseqüentes, produzindo deformação plástica e cisalhamento (Binon, 2000). O maior ângulo de rotação foi encontrado no Grupo Gt, seguido do Grupo G e Grupo Ti, com diferenças significativas entre os três grupos. Os grupos Gt e G tem a mesma composição química e diferem apenas em relação à qualidade da superfície, com aplicação de uma camada de ouro puro de 0,76 micra no parafuso Gt, que reduz significativamente o coeficiente de fricção. O Grupo Ti apresenta o maior atrito entre as superfícies diminuindo o valor do ângulo de rotação. Todos os parafusos apresentavam a mesma geometria, diferindo apenas na composição da liga e/ou no tratamento da superfície. A rotação do parafuso está relacionada ao atrito entre cabeça do parafuso e abutment, e entre os filetes de rosca do parafuso/implante. Considerando que um giro de 360 graus permite a entrada equivalente a um passo de rosca do parafuso, ou seja, a distância entre dois filetes de rosca, no caso igual a 0,4mm, a partir de uma regra de três, podemos concluir que no primeiro aperto/desaperto do parafuso em 32N.cm, o Grupo Gt penetrou 0,039mm, o que corresponde praticamente a um décimo de filete de rosca, enquanto o Grupo G penetrou 0,035mm e o Grupo Ti 0,027mm.
Geralmente, 2 a 10% de redução podem ocorrer na pré-carga nos primeiros segundos ou minutos após o aperto do parafuso, devido a um relaxamento nas tensões do mesmo (embedment relaxation), em função da rugosidade entre as superfícies. Em conseqüência, a força de compressão entre abutment/implante também é reduzida, como resultado direto destas micro-rugosidades. Este relaxamento de tensões é variável de acordo com o tempo, dureza, rugosidade das superfícies contactantes e da quantidade de carga aplicada (Shigley, 1984;49 Jörnéus et al., 1992).36 Após os parafusos serem apertados com 32N.cm, foi estabelecido um tempo de 5 minutos para serem reapertados sob o mesmo torque, em todos os testes realizados para os Grupos 1 e 2.
Os resultados de registro do segundo ângulo de rotação mostram que após este período consegue-se maior penetração do parafuso (Binon, 2000;6 Haack et al., 1995;25 Binon, 1996;5 Aboyoussef et al., 2000).1 Os valores do torque de remoção dos parafusos sempre são menores que os de aperto (Haack et al., 1995;25 Burguete et al., 1994),10 como foi possível verificar em todos ensaios deste trabalho.
Avaliando o primeiro desaperto dos parafusos, verificamos uma diminuição em relação ao torque de aperto (32N. cm) de 22% para o Grupo Ti, e em torno de 38% para os Grupos Gt e G e estas médias mantiveram-se constantes após 5 ciclos de aperto/desaperto. A maior média de destorque foi do Grupo Ti, em função de sua maior dureza em relação às ligas de ouro, portanto, a maior resistência a tração e o maior coeficiente de fricção deste material dificulta a remoção quando comparado aos outros grupos.
Neste trabalho, a média da pré-carga foi de 594N para o Grupo Ti, 934N para o Grupo G e 992N para o Grupo Gt, houve diferença significativa entre os Grupos Gt e Ti e G e Ti. O revestimento de ouro do Grupo Gt não foi suficiente para proporcionar uma pré-carga significativamente maior que o Grupo G. Hagiwara & Ohashi, 1994)27 mostraram que a estimativa da pré-carga por cálculo apresenta resultados muito bons, com total de erro em torno de 10%, considerando que o valor é obtido pela diferença entre torque de aperto e desaperto.
Esta técnica é uma proposta para controle de torque de parafusos na área industrial, utilizando o método de aperto de torque/ângulo. Geralmente, segundo Haack et al. (1995)25 apenas 10% do torque utilizado para aperto do parafuso é transformado em tensão para gerar a pré-carga, sendo que o resto é perdido pela resistência friccional produzida nas superfícies contactantes da cabeça do parafuso e abutment, entre as roscas do parafuso e implante e por algum possível desalinhamento entre abutment/implante.
A relação entre torque/pré-carga, segundo Sakaguchi & Borgersen (1993),47 é dependente do coeficiente de fricção, geometria e propriedades dos materiais, sendo que o primeiro é o de maior importância. Esta relação fica clara neste trabalho pelos resultados do cálculo da pré-carga apenas quando comparamos tipos de liga (ouro e titânio), onde o atrito é o diferencial, mas não quando comparamos parafusos do mesmo tipo liga (G e Gt). Após 1 milhão de ciclos não houve falha em nenhuma das juntas, independente do parafuso utilizado para fixação do abutment ao implante, ou seja, a pré-carga remanescente de todos os parafusos foi suficiente para evitar o afrouxamento nos Grupos Gt, G e Ti.
No trabalho de Binon & McHugh (1996),8 a falha após fadiga ocorreu em média após 4,1 milhão de ciclos sob força de 133,3N, nos parafusos apertados com 30N.cm. A resistência dos parafusos durante o período de teste pode estar relacionada à quantidade de carga, localização e direção das forças e o tempo de aplicação da carga. Segundo Weiss et al. (2000),57 para que haja afrouxamento do parafuso em condições clínicas é necessário que as forças externas consigam sobrepor a tensão (pré-carga) do parafuso e a fricção entre cabeça do parafuso/abutment e filetes de rosca do parafuso/implante. Neste estudo as condições experimentais não produziram afrouxamento dos parafusos, porém, após 1 milhão de ciclos o atrito entre as superfícies contactantes foi mais efetivo na manutenção da pré-carga, como mostra o Grupo Ti.
O coeficiente de fricção é o fator mais importante no desenvolvimento da pré-carga e é dependente da dureza das roscas, acabamento das superfícies, quantidade e qualidade dos lubrificantes e velocidade de aperto (Burguete et al., 1994).10 A magnitude destes fatores são afetados pela presença de lubrificantes e também pelo número de ciclos de aperto/desaperto dos parafusos e considera que o primeiro aperto do parafuso apresenta a maior fricção entre os componentes e após o segundo aperto estes fatores se mantém constantes (Hagiwara & Ohashi, 1994).27
Neste trabalho, não houve presença de saliva, sangue ou fluídos orais que poderiam atuar como lubrificantes e a única variável em relação ao atrito foi o tipo de liga, titânio e ouro, e a aplicação de um lubrificante sólido no Grupo Gt. A presença de lubrificante (Grupo Gt) e as ligas de menor módulo de elasticidade (Grupos Gt e G), apesar de produzirem maior pré-carga inicial, após aplicação de carga mostraram valores de destorque significativamente menores que os parafusos de liga de titânio (Grupo Ti).
Os resultados deste estudo se aproximam dos de Martin et al. (2001),38 em relação aos valores de pré-carga e ângulo de rotação dos parafusos testados no Grupo 1, com diferença em relação aos Grupos Gt e G no cálculo da pré-carga, que não apresentaram diferenças estatísticas significantes. Existem limites neste trabalho ao tentar simular a fixação dos implantes, o padrão mastigatório e as forças oclusais, inerentes a um estudo in vitro.
Tanto o torquímetro digital quanto a máquina de simulação de fadiga foram calibradas previamente, um único operador realizou todos os testes e uma grande quantidade de corpos de prova foram utilizados para tentar minimizar erros. Novos estudos, aumentando o número de ciclos de aperto/desaperto dos parafusos e um maior tempo de ciclagem poderão acrescentar dados relevantes na relação torque/pré-carga e na estabilidade abument/parafuso/implante ao longo do tempo.
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